sábado, 6 de fevereiro de 2010

A Escada de livros.




A menina estava sentada num jardim, um jardim bonito mas rodeado de uma alta muralha. Estava só, a menina. Como tinha ela chegado a este jardim, quem tomava conta dela ou quem lhe dava de comer? Não me perguntem, porque não sei. Só posso dizer que estava ali e se sentia muito só. "Em algum lugar deve haver uma porta na muralha" - pensou. Lentamente, caminhou ao longo do muro a apalpar as pedras, mas não encontrou nenhuma brecha ou abertura. Bateu na parede, mas o som era igual em todo o lado.

Sentou-se então debaixo de uma grande árvore, no meio do jardim. E ouviu, lá no alto, um chilrear de pássaros.

De repente, apareceu um livro mesmo ao lado da menina. Ela abriu-o e viu um A maiúsculo e, à direita, a imagem de

urna ave, a de uma abelha e a de uma aranha. Na página seguinte, havia um B junto a uma bola, um bebe e uma bolinha de gude.

Quando a menina já tinha aprendido todas as letras, chegou um segundo livro flutuando no ar e pousou junto dela; depois um terceiro, um quarto e um quinto... A menina pôs-se a folheá-los.

Cada livro fazia um barulho diferente. Em seguida cheirou-os e cada um tinha um odor próprio.

Ao princípio, a menina só lia as letras, mas depois as letras transformaram-se em palavras, as palavras em frases e, por fim, em histórias.

A menina, não parava de ler. Montou elefantes e camelos, embarcou numa canoa e até deslizou a toda a velocidade sobre o gelo num trenó puxado por cães.

Sentou-se no trono dourado de um palácio e instalou-se na colorida manta de uma tenda de índios. Mas, nos livros, ela encontrou sobretudo outras crianças - crianças divertidas ou tristes, tímidas ou atrevidas, sossegadas ou travessas.

Quando a menina dormia, sonhava com outros meninos. Quando lia, estava com eles. Quando porém estendia a mão para tocar algum menino, tomava a ficar só, e sentia-se triste.

De repente teve uma idéia. Pegou nos livros e com eles fez uma escada muito alta, até conseguir subir por ela e olhar sobre a muralha.

Do outro lado, descobriu um jardim e nesse jardim estava sentado outro menino.

"Eh! Estás a ouvir?", chamou ela.

Ansioso, o pequeno desconhecido ergueu os olhos e estendeu os braços.

Então, a menina desceu ao seu jardim, juntou uma pilha de livros e subiu outra vez até ao alto da muralha. O rapazinho tinha escondido a cara entre as mãos e estava a chorar.

"Aí vão!", gritou a menina deixando cair um livro após outro.

Devagar, como as folhas de uma árvore, os livros caíram na erva.

Sete vezes foi a menina buscar mais, até o menino conseguir fazer com eles uma escada do outro lado da muralha. Em seguida, passo a passo, o rapazinho subiu com toda a prudência.

Os dois meninos deram então as mãos, abraçaram-se e riram. Depois, sentaram-se juntos na muralha, balançando as pernas.



Renate Welsh

escritora nascida em Viena, em 1937. As suas mais de sessenta obras para crianças e jovens repartem-se pelo livro ilustrado, pela biografia e pela narrativa fantástica ou de fundo histórico. Muitos desses livros abordam temas sociais e espelham o interesse da autora pelos mais desfavorecidos, sejam eles trabalhadores, emigrantes, toxicodependentes ou deficientes (A Casa nas Árvores, 1993; O Rosto no Espelho, 1997; A Visita que Veio do Passado, 1999, etc

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